Em nossas andanças pelo Recife, sempre somos parados por um torcedor desejoso de conversar sobre o atual futebol brasileiro, e em especial o pernambucano.
Ontem tivemos mais um desses encontros, e o assunto foi sobre as dificuldades da ida a um estádio de futebol, para assistir um jogo do seu time, que no caso especifico seria o Sport Recife.
Suas colocações são muito mais importantes do que muitas pesquisas realizadas, por tratar-se da vivência do dia a dia, ou do jogo a jogo.
Na realidade falou muito mal das acomodações do Arruda, por conta da falta de limpeza, mas centrou as suas reclamações no tratamento que é dado por seu clube, e deixou bem claro que tais fatos o tiraram do evento futebolístico, dando preferencia a poltrona de sua casa.
Como ele, certamente são milhões de torcedores em todo o país, que perderam totalmente a vontade de frequentar os estádios de futebol. Estamos no meio desses.
Nos contou que tinha um adesivo com o escudo do seu clube posto no carro, e que após uma partida encontrou-o riscado. Aliás sempre fazemos uma pesquisa visual nos veículos que se movimentam em nossas ruas, e tais adesivos são raridades, pelo receio de que possa acontecer o que sofreu esse torcedor.
Para ele, o futebol de Pernambuco está atrasado com relação à venda de ingressos, e que existe um esquema preparado pelos clubes para esgota-los antecipadamente, e posteriormente os cambistas fazem a festa.
Tentar compra-los é um verdadeiro sofrimento, desde que não existe uma descentralização de vendas, o que é obrigatório pelo Estatuto do Torcedor. Na realidade nada mais grotesco do que as filas para a aquisição dos bilhetes, como estivéssemos ainda no século XX, sem a tecnologia necessária.
Nos jogos realizados no Mineirão em que fomos algumas vezes, os ingressos foram comprados via internet, com pagamento pelo cartão, e o boleto pago com o código de barra, é comprovado nas catracas eletrônicas da Arena. Tempos modernos, enquanto Pernambuco vive na era da brilhantina.
A saga continua de forma espetacular, que segundo o nosso torcedor, usar o transporte coletivo é impossível, e o carro é usado. Ao chegar no estacionamento do clube esse está lotado, desde que entram os não sócios, graças a um¨pedido¨ formulado a um dos responsáveis pelo setor.
Por isso fica procurando nas ruas paralelas e, enfim consegue uma vaga. Ao estacionar um ligeiro flanelinha aparece, com uma cobrança antecipada. Se não pagar, pobre carro.
Reclamou da falta de orientação quando segue para as entradas do estádio, Filas desorganizadas, com a lei do mais forte imperando, e mais um sacrifício. Algumas vezes os portões são arrombados, ou fechados pela Policia.
O nosso torcedor é proprietário de uma cadeira. Quando chega ao local, sempre encontra alguém sentado na sua propriedade, e quando se identifica, o abusado intruso manda-lhe procurar um outro lugar.
O interessante é que todo esse sacrifício poderia ser abonado se a partida fosse de qualidade, mas a ausência de bons jogadores, dos gols, o excesso de faltas e de passes errados, não compensa essa dura saga.
Quando se encerra o primeiro tempo procura um sanitário, e toma um susto com a falta de higiene, o mesmo com os bares. Os fundos de suas calças estão sujos, posto que as cadeiras não são limpas.
Sua história daria para um roteiro cinematográfico.
O único elogio foi para a Arena Pernambuco, apenas para os jogos diurnos, onde tudo corre bem como nos lugares civilizados. Não frequenta os noturnos por conta da volta em uma estrada dentro da mata escura, ficando sujeito aos assaltos.
Imagine se esse torcedor fosse a um campo do interior.
O seu depoimento representa não apenas a saga de um torcedor do nosso estado, e sim de milhões de brasileiros que sofrem com tais problemas, e com a gravidade maior de que ninguém se apresenta para resolve-los, mesmo observando uma ociosidade nos campos de jogos.
O torcedor brasileiro é um verdadeiro herói da resistência.